A implantação do calvinismo no Brasil
ocorreu em meados do XVI, com a chegada, da esquadra francesa que tentaram se
estabelecer na Baía da Guanabara a chamada França Antártica, o chefe da
expedição, o vice-almirante Nicolas Durand de Villegaignon, buscando elevar o
nível moral e espiritual da comunidade, escreveu ao próprio Calvino
solicitando-lhe o envio de colonos reformados. Calvino e a Igreja Reformada de
Genebra atenderam prontamente o pedido, enviando vários correligionários sob a
liderança de dois pastores, que chegaram ao Rio de Janeiro no início de 1557.
Pouco depois, surgiram desavenças entre Villegaignon e os calvinistas, que
resultaram na expulsão deste últimos da pequena ilha em que a colônia fora
instalada. Isso os colocou em contato com os tupinambás, a quem tentaram
evangelizar.
Eventualmente, o pequeno grupo
regressou para a França, estando entre eles o sapateiro Jean de Léry, que veio
a tornar-se um pastor e escreveu o célebre livro História de uma Viagem à Terra do Brasil, publicado em 1578.
Quando o navio ameaçou naufragar, cinco reformados ofereceram-se para retornar
ao continente, sendo imediatamente presos por ordem de Villegaignon. Obrigados
a responder a uma série de perguntas teológicas, eles produziram a notável Confissão de Fé da Guanabara, com base na qual três deles foram
executados. Dos demais, um foi poupado por ser o único alfaiate da colônia e o
outro conseguiu fugir, sendo mais tarde preso e enforcado. Essa experiência,
embora efêmera e fracassada, passou à história como o primeiro esforço
missionário feito por protestantes no sentido de evangelizar povos pagãos.
No século seguinte, houve nova presença
reformada Brasil, dessa vez de modo muito mais marcante, quando os holandeses da Companhia das
Índias Ocidentais ocuparam o nordeste durante 24 anos (1630-54). A igreja
reformada do Brasil holandês chegou a ter mais de vinte comunidades, dois
presbitérios e um sínodo, sendo em tudo uma igreja presbiteriana, exceto no
nome. Além de dar assistência religiosa aos colonos europeus, a igreja realizou
uma importante obra missionária e beneficente junto aos silvícolas. Um aspecto
muito significativo desse experimento foi o fato de que, especialmente durante
a administração do príncipe João Maurício de Nassau-Siegen (1637-44), os
holandeses concederam aos residentes católicos e judeus da colônia uma medida
de liberdade religiosa até então inédita na América Latina.
Com a expulsão dos holandeses, não
houve qualquer presença expressiva de protestantes no cenário brasileiro
durante um século e meio. Foi somente no início do século XIX, com a
transferência da corte portuguesa para o Brasil, que o protestantismo começou a
implantar-se definitivamente no país. O célebre Tratado de Comércio e Navegação, firmado entre Portugal e a Inglaterra
em 1810, pela primeira vez tornou possível o exercício legal do culto
evangélico no Brasil, com algumas restrições. Poucos anos mais tarde, com a
independência e a necessidade de atrair imigrantes europeus, aumentou
consideravelmente o ingresso de protestantes filiados a diferentes confissões.
Dentre os primeiros imigrantes
protestantes a se fixarem no Brasil em números expressivos, dois grupos se
destacam: os anglicanos, a partir de 1808, e
os luteranos, a partir de 1824.
Todavia, desde o início também começaram a chegar reformados de diferentes
nacionalidades. Assim sendo, em junho de 1827 foi fundada no Rio de Janeiro,
por iniciativa do cônsul da Prússia, a Comunidade
Protestante Alemã-Francesa, uma igreja composta tanto de luteranos quanto de
calvinistas franceses, alemães e suíços.
Nas décadas seguintes, começaram a
chegar ao Brasil protestantes movidos por uma motivação diferente. Ao contrário
dos imigrantes, que limitavam as suas atividades religiosas às suas próprias
comunidades étnicas, a partir de 1835 surgiram missionários procedentes do
hemisfério norte interessados em alcançar com a sua pregação os próprios
brasileiros. Os primeiros deles foram metodistas e congregacionais. Essas duas
modalidades de protestantismo são denominadas pelos estudiosos como "protestantismo
de imigração" e "protestantismo missionário."
Dois pastores norte-americanos
destacaram-se nesse período: Daniel Parish Kidder e James Cooley Fletcher. Kidder, um ministro metodista, residiu no Brasil de 1837 a 1840 e viajou
extensamente pelo país distribuindo bíblias e fazendo importantes contatos com
políticos e intelectuais liberais como o regente Diogo Antonio Feijó. Em São
Paulo, Kidder ofereceu ao governo da província Novos Testamentos para serem
usados nas escolas públicas, mas sua oferta foi rejeitada por interferência do
bispo local. Retornando para os Estados Unidos, ele escreveu a importante obra Reminiscências de Viagens e Permanência no Brasil, publicada em 1845.
Um nome freqüentemente associado com
Kidder é o do pastor presbiteriano James C. Fletcher (1823-1901), que teve uma longa e frutífera ligação com o Brasil a
partir de 1851. Embora Fletcher não tenha se envolvido diretamente com a
evangelização dos brasileiros, limitando sua atuação religiosa às comunidades
de imigrantes, seus esforços contribuíram em muito para a consolidação do
protestantismo no Brasil. Ele tornou-se amigo do imperador D. Pedro II e de
muitas figuras destacadas da sociedade brasileira, e lutou em favor da
liberdade religiosa, da emancipação dos escravos e da imigração de
protestantes. Fletcher planejou e executou uma exposição industrial americana
no Rio de Janeiro, promoveu os métodos educacionais norte-americanos e
acompanhou industriais e cientistas em visita ao Brasil. Eventualmente, ele
tornou-se membro correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
e por mais de vinte anos foi um incansável defensor dos interesses brasileiros
na imprensa norte-americana.
Outra importante contribuição de
Fletcher foi o livro O Brasil e os Brasileiros, publicado em 1857,
atualizando e ampliando a obra anterior escrita por Kidder. Esses livros
tornaram-se clássicos (o de Fletcher chegou a nove edições) e despertaram
grande interesse pelo Brasil entre os norte-americanos. Nessas obras, Kidder e
Fletcher descreveram o Brasil como um país vasto, dotado de recursos
extraordinários, porém prejudicado pelo atraso econômico, pela falta de escolas
e pela ignorância religiosa. A religião oficial não estava tendo êxito em
educar o povo nos princípios éticos e espirituais do evangelho. Fazia-se
necessário, portanto, para o progresso e a prosperidade do povo brasileiro, que
os norte-americanos lhes levassem a sua religião, os seus valores e os seus
métodos educacionais.
E aqui voltamos ao nosso personagem
principal. É provável que Simonton tenha lido esses livros e daí tenha
resultado o seu interesse pelo Brasil e pela situação espiritual dos
brasileiros. Seja como for, quando chegou ao Rio de Janeiro há 140 anos, ele
não deparou-se com um terreno totalmente por desbravar. A sua chegada havia
sido precedida por algumas gerações de protestantes, cujos esforços facilitaram
em muito o seu trabalho. Ele foi um pioneiro no sentido de implantar sólida e
definitivamente em solo brasileiro o presbiterianismo, ao contrário das
experiências temporárias anteriores. Com Simonton, pela primeira vez o
movimento reformado, calvinista e presbiteriano fincou raízes não somente no
Brasil, mas entre os próprios brasileiros.
Em virtude da falta de fluência na
língua portuguesa, nos seus primeiros tempos no Brasil Simonton limitou-se a
proferir as suas prédicas em navios ancorados na Baía da Guanabara e em
residências de estrangeiros. Logo travou contato com o Rev. Robert R. Kalley, um missionário escocês que chegara ao Brasil
quatro anos antes e dera alguns importantes passos no sentido de ampliar a
liberdade religiosa então existente. Em abril de 1860, Simonton finalmente
conseguiu dirigir o seu primeiro culto em português. Três meses mais tarde,
chegaram valiosos reforços na pessoa do Rev. Alexander L.
Blackford e sua esposa
Elizabeth, irmã de Simonton. No final do ano, Simonton fez uma longa viagem de
reconhecimento pelo interior, passando por São Paulo, Sorocaba, Itapetininga,
Itu e Campinas. Fez várias pregações, visitou ingleses e alemães, hospedou-se
com liberais e conversou com sacerdotes.
Ao descrever essa viagem, Simonton
deixou um curioso testemunho sobre o choque cultural que experimentava. Na
região de Itapetininga, ele passou algum tempo em uma fazenda cuja
hospitalidade muito apreciou. Todavia, não pode deixar de notar a casa
desmazelada e suja, sem assoalhos, com falta de janelas e portas, e os porcos,
galinhas, cachorros, vacas, cavalos e mulas que entravam livremente. Diz ele:
"Nunca vi família tão excelente, com suficientes recursos, viver tão mal.
Escravos por toda a parte, uns atrapalhando os outros; tábuas abandonadas na
serraria a 100 metros de distância; não consigo entender tanto descaso e
negligência. Dia após dia eu observava e me maravilhava do processo como se
dirigia a empresa toda. Ao ver João Carlos [Nogueira], um dos brasileiros de
coração mais bem formado, em outros aspectos um homem de bom senso, viver
daquele modo, minha confiança no Brasil e nos brasileiros diminuiu."
A partir de maio de 1861, o melhor
domínio da língua permitiu que Simonton tivesse mais êxito em atrair
interessados e ele manifestou a satisfação de finalmente poder anunciar a sua
mensagem aos brasileiros (e portugueses) e ver os primeiros frutos. Finalmente,
a 12 de janeiro de 1862 concretizou-se a primeira grande realização de
Simonton, que foi a fundação da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro. Naquele dia,
estando presente um novo missionário recém-chegado, Francis J. C. Schneider,
Simonton admitiu formalmente à igreja os seus dois primeiros membros,
curiosamente ambos estrangeiros – um americano, agente da Companhia Singer de
máquinas de costura, e um português. Que esse evento foi muito significativo, o
próprio Simonton o atesta em seu Diário, onde, ao registrar
o fato, concluiu: "Assim, organizamo-nos em igreja de Jesus Cristo no
Brasil."
Pouco tempo após a fundação da igreja,
Simonton regressou aos Estados Unidos para gozar o seu primeiro e único
"furlough," antecipando uma viagem que pretendia fazer no final do
ano. Essa antecipação deveu-se principalmente ao estado de saúde da sua mãe. Ao
chegar, Simonton soube que ela havia falecido recentemente e também afligiu-se
com os horrores da Guerra Civil. Falou sobre o seu trabalho em diversas
igrejas, inclusive na maior igreja portuguesa de Jacksonville, Illinois, onde
os fiéis encantaram-se em ouvir um americano expressando-se tão bem em seu
idioma. Em março de 1863, Simonton casou-se com Helen Murdoch e quatro meses depois
o novo casal chegou ao Rio de Janeiro. Com o regresso de Simonton, o casal
Blackford mudou-se para São Paulo, a fim de ali iniciar a obra presbiteriana.